maio 24, 2007

Compasso Ternário

Os meus passos são sozinhos.
Não tenho e desprezo
Quem faça entendimento das palavras que digo.
Não me tentem saciar por dentro
Que por dentro sou insaciável!
Eu só quero beijos!
Eu só quero amor sincero
À beleza que em mim tenho.
Mas amar não posso.
Porque amo a beleza que em mim nasce,

mas que não me pertence
e se funde na atmosfera terrestre
qual oxigénio
que o mundo inteiro inspira e engole.
E me usurpa do peito.

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Quando o tempo me tira o falso ter e querer,
ficas tu.
Quando o vento me leva a razão das coisas
só ficas tu.
Quando eu me arranco à torrente inútil de existir
só tu me restas.
E não confortas,
antes me estripas e me arrastas,
me torturas e em vão me matas,
para que no meu renascer te faça de novo
o meu alento,
para que repetidamente me arrebates,
para que interminavelmente me beijes,
me sufoques, me adormeças e me despertes.
Para que interminavelmente te ame.
Na suspensão da tua vontade
antes da minha, que morre de medo
de falsamente te ter e querer.
E de se perder.

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No firmamento que me embala o sono
Eu sonho levar-te até ao fim do mundo.
Até ao fim dos teus beijos,
até ao fim do teu corpo
até que não te reste no tempo um segundo.

Quero absorver-te e roubar-te
Quero morrer e matar-te
enquanto te vou sorvendo os cigarros
feita sanguessuga de almas
feita puta dos teus lençóis,
feita camioneta sem faróis
(ou bicicleta sem travões?)

E a minha guitarra
ensaia os teus acordes naturais,
decora as tuas mãos infernais,
dedilha os teus lábios aos tropeções.

Em que pernas terão eles bailado?
Que mares em chamas terão afogado?
E eu vou mirrando de ciúmes,
encolhendo de ignorância,
apodrecendo de insignificância,
com o impulso de te agarrar
e roubar e esfolar e matar.

Tu por mim não morres.
Não foges, não choras, antes dormes
na paz de quem tudo tem
no sono de quem não quer nada.
Mar choco da minha antiga existência
Mar aberto da omnipotência,
águas paradas sem graça nenhuma.

Mas vais vindo com ilusões,
até ao dia em que eu te tranque cá dentro
Em que me fumes como aos cigarros,
Em que tenhas tu ciúmes dos meus lençóis.


(Casamento Fictício)